Por estes dias de calor abrasador, em que só apetece dar folga a enxadas e ancinhos e ficar a gozar o fresco da sombra da figueira (embora digam que é doentia; mas, à falta de bananeiras, é a que se pode arranjar), as rãs-verdes que vivem na periferia do tanque podem ser uma fonte suplementar de inspiração para quem optar por encanar a perna, de preferência com siesta, e entregar-se a um estado total de dolce far niente. Além de trabalharem para o bronze, lançam-se à água à nossa passagem (que remédio!) para banhos retemperadores e encenam até a sua "natação obrigatória" (título de um tema muito sugestivo da mítica Banda do Casaco) nos fundos lodosos do charco, se nos demorarmos à sua beira. Fora estes picos de actividade, em terra ou boiando por entre caules submersos de poejo e agrião, as rãs esperam apenas que a comida passe à frente das suas bocarras insaciáveis: insectos, aranhas, minhocas e caracóis são a sua perdição, cujo controlo as torna de enorme utilidade na horta. Os machos dão-se ainda ao trabalho de coaxarem freneticamente, noite e dia, por uma boa causa e de a perseguirem até à exaustão. Olímpico esforço coroado com um escaldante amplexo axilar que prenuncia a renovação da espécie. Uf! Aqui chegados depois deste afã e para sermos rigorosos, encanar a perna à rã só mesmo no inverno, durante o período de hibernação.
Coro das Rãs
Mais forte ainda
será nossa voz, se jamais
em dias soalheiros
saltámos no meio da galanga
e do junco, gozando o nosso canto
entre mergulhos sem fim,
ou se, fugindo à chuva de Zeus, no fundo da água entoámos
coros variados de dança,
ao som do rebentar das bolhas.
(Aristófanes, As Rãs, 241-249 , traduzido do grego por Maria Helena da Rocha Pereira, Hélade - Antologia da Cultura Grega, 1ª ed. 1959)
Parte do charco onde vivem as nossas rãs-verdes
O charco, à saída do tanque
Uma rã temerária (Foto: Ricardo Desirat)
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